"Às vezes eu me pergunto: Quantas crianças precisam morrer para um playboy fumar um baseado?"
Essa conta ainda não foi feita. O bando de sociólogos pseudo-cults está muito mais ocupado em inflar o seu próprio ego do que encarar a realidade. Porém, o produto final dessa matemática macabra está por toda parte, escancarada em qualquer estatística que acostumamos a ignorar. O assunto parece clichê, piegas ou até mesmo hipócrita. O filme que relata isso não (uma das cenas mostrada no vídeo acima).
"Tropa de Elite", com direção e produção de José Padilhe, o mesmo do documentário Ônibus 174, apresenta à elite o policial do B.O.P.E., Capitão Nascimento, autor da frase que inicia esse texto e interpretado impecavelmente por Wágner Moura. Além da parte falida e corrupta da polícia militar carioca e o poder que o tráfico exerce na cidade - temas já abordados em outros filmes, como Cidade de Deus - a produção, prevista para entrar em cartaz ainda esse ano (mas que teve uma cópia divulgada clandestinamente na internet), inova e, ao mesmo tempo, choca uma sociedade hipócrita que, sarcasticamente, dá aval ao motor que sustenta a indústria do tráfico: Você, maconheiro. Você, que acha o maior barato fumar "unzinho" em suas rodinhas pseudo-anárquicas. Você, que se reúne a seus cúmplices para queimar a bandeira da opressão, da elite, ou da aversão ao sistema enquanto fuma o destino de milhares de crianças com dias limitados à bala de fuzil na cabeça. É você, seu maconheiro, que abastece o bolso de traficantes em troca de meia hora de "diversão". Eu tenho nojo disso. Eu tenho nojo de você.
Uma pessoa que usa drogas não tem o direito de reclamar do sistema. Não tem o direito de botar a culpa dos males da sociedade na violência, nem nos políticos. Uma pessoa que compra maconha e pó da mão de bandido, também é bandido. Mas, nesse mundo que sempre há de ter forças para nos surpreender, em mais uma de suas irônicas inversões de valores, o que vemos é uma adoração a esse tipo de gente, seja na mídia (adotando ícones como Marcelo D2 e seu Planet Hemp), nas ruas, nos morros e, para mim, a parte mais irônica dessa história: Nas Universidades.
O local que era para ser o centro da formação intelectual dos jovens, vira a casaca ao transformar-se em um culto à bestialidade. O cara descolado da turma é o que traz a droga. "O foda da faculdade, é que à primeira vista os estudantes são caras legais pra caralho. É um lugar cheio de mocinhas lindas e com boas intenções". O que vemos nos indignamentes denominados Centros de Ciências Humanas é o lixo cultural que contaminou os valores da sociedade. E esse esgoto da modinha em ser rebelde fede. E muito. Como Você, maconheiro, tem estômago para discutir consciência social e cultura depois de enrolar um baseado? Você não se sente parte do crime? Você não percebe que é usado e incentivado pelos traficantes midiáticos e marqueteiros a se transformar em uma mula? Se ainda lhe restou algum neurônio, maconheiro, pense.
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Você e seus amigos se sentem bem à mesa de um bar. Trocando idéias e tomando cerveja, horas passam com um rapidez agradável. As histórias que ocorrem são hilárias e relembrar as tais com outros amigos, tomando outras cervejas, fazem você se sentir melhor ainda. Eu sei, eu também sou assim. Tomar umas com os amigos é demais. E, afinal de contas, se você souber se controlar, a cerveja nem faz tanto mal à saúde. Não exagerando na dose, evitando não beber antes de pegar o carro e com outros pequenos cuidados, você e seus amigos podem passar anos nessa bohemia saudável.
Agora, vamos viajar um pouco:
Imagine se surgissem reportagens denunciando uma cervejaria - tomemos como exemplo fictício a Skol - que usa, como trabalhadores, jovens e crianças de até 10 anos de idade. Nessa fábrica, os presidentes da empresa estão milionários, enquanto seus operários juvenis são arrancados de suas famílias, deixando mães aos prantos, e obrigados a trabalharem dia e noite em troca de trocados e pares de tênis importados.
A rotina é cruel, todos os empregados perderam a identidade, nunca pisaram na escola e só se comunicam por um dialeto exclusivo do ambiente. Quem passa na frente dessa cervejaria-fictícia para comprar sua cervejinha não enxerga seus bastidores. Porém, a reportagem é avassaladora. Escancara a violência que rege a organização. Em uma cena, obtida com uma câmera escondida também fictícia, pode-se ver algo chocante: um operário da Skol de 10 anos, ao derrubar por acidente uma garrafa que seria abastecida, é espancado pelos superiores. O sangue do menino se espalha entre a cerveja que escorre no chão. Seu colega, de idade semelhante, que não relatou o incidente ao chefe, sofre pena mais grave: tem sua cabeça estourada por uma espingarda calibre 12. Após alguns funcionários retirarem os dois pequenos corpos, já desfigurados, o trabalho recomeça na fábrica.
Diga com sinceridade: após essa reportagem fictícia, você se sentiria confortável para tomar uma Skol com seus amigos? Você iria achar legal o cara que leva umas latinhas da cerveja na mochila e distribui para os colegas da faculdade? Você não se sentiria culpado em ajudar a financiar tudo isso? Não iria lembrar da imagem com os dois garotos ensangüentados a cada gole de cerveja que tomasse?
Claro que isso é só ficção. Não tem nada a ver com a nossa realidade. É apenas um mundo imaginário que se parece com o nosso. Com problemas fictícios que se parecem com os nossos.
É impossível mudar o passado. Somos obrigados a conviver com o presente. Mas o futuro: esse a gente pode mudar.